terça-feira, 22 de janeiro de 2008

Os que vão e os que ficam

Nunca tinha pensado no assunto, até que um dia, lá pelos anos de 79 ou 80, sei lá eu, uma menina da minha idade bateu na nossa porta, me cumprimentou pelo nome e perguntou se eu lembrava dela. Não, sinceramente, não. Mas convidei-a a entrar e ficamos batendo papo por uma meia hora, ela perguntando sobre todos nossos amigos do colégio, eu respondendo, ainda sem lembrar dela. Só depois que saiu é que fui procurar as fotografias antigas da nossa turma e a reconheci nas fotos do pré-primário.

Então me ocorreu que quem vai embora leva consigo um registro daquele momento específico. Leva todo um mundo congelado no tempo. Mas, pra quem fica, quase nada mudou. Apenas o surgimento de uma ausência, em geral logo preenchida por novas presenças. Pois quando chegou a minha vez de sair de cena, fiquei fotografando meu mundo pra levar comigo. Não queria que meus amigos se esquecessem de mim, mas, quanto a isso, não havia muito que pudesse fazer.

Quando cheguei em Porto Alegre sentia-me como se tivesse aterrizado em outro planeta - e estava no mesmo país, falando a mesma língua, só com um cantar um pouco diferente! Mas não conhecia ninguém - nenhum rosto, nenhuma rua, nenhum lugar especial, nada. Tudo que eu conhecia tinha ficada pra trás. Vim com família, com tudo que eu tinha na bagagem, sem perspectiva de retornar. Experiência bem diversa de quando fui estudar em Nova Iorque.

Já havia estado por lá várias vezes, em viagens de férias. Já conhecia alguns rostos, já sabia onde ir pra se chegar nos lugares, já tinha alguns lugares pra ir. Mas fui sozinha, deixando tudo em compasso de espera - família, amigos, emprego, cachorros. Fui com prazo pra voltar, com a idéia de aprender o máximo possível, sabendo ser essa uma chance única na minha vida. Consciente de que pra quem vai, um novo universo se abre, mas pra quem fica, a paisagem quase não se altera, tentei manter-me sempre atualizada, em contato com esse lado do mundo a cada nova estadia em Porto Alegre, para estar em dia quando regressasse de vez. E, no entanto, ficava com uma sensação de não pertencer a lugar algum. Pois, sem estar construindo nada por aqui, era apenas uma visitante. Retornando a Nova Iorque, nada era definitivo. Estava apenas buscando qualificar meus conhecimentos. Meu prazo se ampliou, não consegui o que queria mas recebi o que precisava. É assim que Deus trabalha.

Neste sábado passado fomos nos despedir do nosso amigo Dessórdi que está indo pros EUA. Vai pra lá na mesma situação em que eu fui: pra estudar, com data pra retorno. Como cada pessoa desenha sua própria estrada, não tenho como saber o que ele encontrará por lá. Mas desejo de todo coração que encontre o que procura. E que volte! Pois se é verdade que pouco se altera com a nossa ausência, o que está por vir depende de cada presença neste cenário. Cada pessoa contribui com um novo detalhe na paisagem que, após algum tempo, seria bem diferente se ela não tivesse estado ali. E acho que nossa paisagem fica mais bonita com a presença de bons amigos como ele!

Dessórdi, um grande abraço!



Bota-fora do Dessórdi

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